quinta-feira, 13 de junho de 2013

TRT4 entende que pedidos de rescisão indireta e reintegração do empregado em estabilidade provisória são compatíveis



PROCESSO: 0000933-39.2011.5.04.0102 RO


EMENTA
GARANTIA PROVISÓRIA DE EMPREGO. RESCISÃO INDIRETA. O ajuizamento de ação onde buscada a rescisão indireta do contrato de trabalho não implica renúncia à garantia  provisória de emprego da qual o empregado é detentor. Existência de compatibilidade entre ambos os direitos.

ACÓRDÃO
preliminarmente, por unanimidade, NÃO CONHECER DO RECURSO QUANTO À PRETENSÃO DE PAGAMENTO DAS MULTAS DOS ARTIGOS 467 E 477 DA CLT por ausência de fundamentação válida. No mérito, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA RECLAMANTE para: (a) decretar a rescisão indireta do contrato de trabalho por culpa do empregador; (b) declarar o seu direito à garantia provisória de emprego; (c) determinar:   anotação na CTPS da autora da data de saída em 21.10.2012;  expedição de alvará para liberação do FGTS;   expedição de alvará judicial para encaminhamento do benefício do seguro-desemprego após o trânsito em julgado da decisão, e, se negado o benefício pela autoridade competente por culpa imputável ao empregador, fixar indenização a ser paga pela reclamada em valor equivalente ao benefício que deixou de ser recebido; (d) acrescer à condenação o pagamento de: indenização correspondente aos salários do período da garantia provisória de emprego  acidentária, desde a alta do benefício em 21-09-2011 até 21.09.2012;  aviso prévio de trinta dias; diferenças de férias com adicional de 1/3, gratificações natalinas, adicional de insalubridade e FGTS relativos ao período de 21-09-2011 a 21-10-2012 (pelo cômputo do período relativo à garantia provisória de emprego e do aviso prévio); acréscimo de 40% sobre o FGTS de todo o lapso contratual.  Valor  da  condenação  majorado  em R$15.000,00, e custas em R$300,00, para os efeitos legais.

RELATÓRIO
Inconformada com a decisão de primeiro grau (fls. 129-34, integrada pela sentença de embargos de declaração das fls. 146-7), que julga procedente em parte a ação, a reclamante recorre. Pelas razões das fls. 150-3, busca a reforma da sentença quanto à garantia provisória de emprego acidentária, término do contrato e rescisão indireta.
Sem apresentação de contrarrazões, sobem os autos a este Tribunal para julgamento e são distribuídos a esta Relatora na forma regimental.

VOTO RELATOR
DESEMBARGADORA CARMEN GONZALEZ:

PRELIMINARMENTE
Multas dos artigos 467 e 477 da CLT - Não conhecimento - Ausência de ataque à sentença
As multas previstas nos artigos 467 e 477 da CLT foram indeferidas na origem sob o fundamento de que "as rescisórias restaram controvertidas e a declaração de rescisão se dá apenas nesta sentença".
Em suas razões recursais a reclamante limita-se a reiterar o pedido de incidência de tais multas, sem apresentar ataque aos fundamentos da sentença para indeferimento de tais verbas. Sinalo que o indeferimento das multas em epígrafe não decorreu do não reconhecimento da rescisão indireta, nem do entendimento de que houve renúncia à garantia provisória de emprego.
O recurso não está fundamentado, atraindo a incidência, por analogia, da jurisprudência sedimentada na Súmula 422 do TST, in verbis:
RECURSO. APELO QUE NÃO ATACA OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO RECORRIDA. NÃO-CONHECIMENTO. ART. 514, II, DO CPC. Não se conhece de recurso para o TST, pela ausência do requisito de admissibilidade inscrito no art. 514, II, do CPC, quando as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que fora proposta. 
Assim, preliminarmente, não conheço do recurso, no tópico, por ausência de fundamentação válida, conforme orienta a Súmula 422 do TST. 
MÉRITO
Garantia Provisória de Emprego - Término do Contrato - Rescisão Indireta
Na petição inicial afirma a autora que trabalhava em condições insalubres e não recebeu o respectivo adicional e que, além disso, outros direitos não foram observados. Alega que não foram efetuados depósitos de FGTS desde novembro de 2007 e que, apesar de continuar com sua CTPS assinada, não recebe qualquer remuneração desde setembro de 2011. Aduz ter recebido auxílio doença acidentário a partir de 03.03.2008, o qual foi cancelado em 20.09.2011. Afirma que, ao ter seu benefício previdenciário cancelado pelo INSS, apresentou-se à empresa para retornar ao trabalho, contudo não foi reintegrada aos quadros da empresa, bem como não recebeu os salários, apesar de ser detentora de garantia provisória de emprego. Sustenta que, desse modo, diante da conduta ilegal e negligente da ré, viu-se obrigada a ajuizar a presente demanda, onde pretende a rescisão indireta do seu contrato de trabalho, com fulcro no artigo 483, "d", da CLT. Assevera que sua saída da empresa se opera somente em razão do descumprimento de obrigações fundamentais do contrato de trabalho, o que impossibilita a almejada continuação da relação de trabalho. Afirma que em razão de sua garantia de emprego acidentária, o vínculo deveria ser mantido até 21.09.2012. Refere que a empresa ré enfrenta um processo de recuperação judicial e sob tal alegação não a reintegrou às suas funções, sendo cabível o pagamento de indenização correspondente aos salários do período estabilitário. Postula a baixa do contrato de trabalho em sua CTPS, com data de 21.10.2012, considerando o cômputo do período da garantia de emprego e do aviso prévio. Pretende, ainda, o pagamento de aviso prévio, férias e gratificações natalinas do período, depósitos do FGTS e acréscimo de 40%, liberação das guias do seguro desemprego ou pagamento de indenização correspondente, multa dos artigos 467 e 477 da CLT. No aditamento da fl. 72, postula o reconhecimento de que era detentora de garantia provisória de emprego, com pagamento de indenização compensatória equivalente a 12 meses de remuneração.
A reclamada contesta aduzindo que a autora foi admitida em 30.03.2005 e trabalhou até ser afastada em razão de doença (não profissional), com requerimento datado de 03.03.2008, sendo que nunca mais se reapresentou na empresa para retomar suas atividade. Alega que até o ajuizamento da demanda não tinha conhecimento de que a reclamante tivesse recebido alta previdenciária. Refere que o benefício para o qual a autora foi encaminhada foi auxílio doença e não auxílio acidente. Assevera que a autora não foi acometida por doença profissional, não havendo falar em garantia de emprego. Nega que a reclamante tenha se apresentado à empresa após o final da fruição do benefício previdenciário, asseverando que não haver motivo a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Sustenta não ter havido qualquer descumprimento das obrigações contratuais para com a reclamante, devendo ser julgados improcedentes os pedidos. 
A julgadora de origem considera que a reclamante gozou benefício previdenciário da espécie acidentária e, portanto, faz jus à garantia provisória de emprego, a ser contada a partir de 21/9/11, inclusive, e prevista para valer até o futuro 20/9/12. Refere que, todavia, a autora optou por ingressar com a presente demanda em 04/11/11, aproximadamente um mês após o início do período de garantia, postulando o reconhecimento de rescisão indireta por justa causa cometida pela empregadora que seria consistente no ato de esta não lhe aceitar novamente no trabalho. Entende que não aceitar a reclamante no trabalho não é motivo para rescisão indireta, referindo que, de qualquer sorte, a reclamada, ao defender-se, negando a despedida, deixa claro que considerava o contrato de trabalho ainda em aberto. Destaca que poderia a reclamante ter postulado fosse reconhecida uma despedida imotivada e, ainda assim, em respeito à garantia, deveria ter pedido, sim, a nulidade da despedida para efeito de tempestiva reintegração, com a devida indenização do tempo de garantia ultrapassado antes da efetiva reintegração. Considera que a garantia provisória é direito renunciável e julga improcedente o pedido de rescisão indireta por não encontrar suporte fático. Entende que houve simples pedido de demissão da reclamante, na data de ajuizamento da presente, 04/11/11. Julga devidos os salários de 21/9/11 a 04/11/11, com renúncia ao restante do período de garantia provisória por benefício previdenciário e sem direito a aviso-prévio e respectiva projeção. Afirma que são devidas verbas rescisórias típicas da modalidade de extinção contratual por livre iniciativa do empregado (fl. 146-verso). Determina que a reclamada registre na CTPS da reclamante a data de término do contrato e defere o pagamento dos salários do período da garantia provisória de emprego, até o advento do término do contrato, em 04/11/11;  férias referentes ao período aquisitivo de 2007/2008, acrescidas do terço constitucional, de forma simples; 1/12 (um doze avos) de décimo terceiro salário proporcional do ano de 2011.
Inconformada, a reclamante recorre. Reitera as alegações da inicial, aduzindo que o ajuizamento da presente ação foi o único meio pelo qual  pode buscar a efetivação dos direitos que lhe são assegurados pelo ordenamento jurídico. Afirma que a empresa recorrida entrou com pedido de recuperação judicial no dia 16.06.2011, tendo encerrado suas atividades antes mesmo do cancelamento de seu benefício previdenciário. Aduz que era detentora de garantia provisória de emprego acidentária, não se conformando com a interpretação dada ao seu pedido de rescisão indireta, haja vista o descumprimento pelo empregador de obrigações do contrato de trabalho, como o pagamento de salários e os depósitos do FGTS. Alega ter postulado a conversão da aludida garantia de emprego em indenização compensatória, pois era impossível sua recolocação na empresa diante do encerramento das atividades dessa. Assevera que em momento algum renunciou à garantia de emprego a que tem direito. Afirma que apenas permaneceu em funcionamento na empresa o setor administrativo e que a culpa do empregador configurou-se no momento em que deixou de readmiti-la, furtando-se do pagamento dos salários, recolhimentos previdenciários e depósitos de FGTS e deixando de formalizar a rescisão, com quitação das verbas decorrentes e baixa na CTPS. Pretende a reforma da sentença para que, reconhecida a garantia provisória de emprego, seja a reclamada condenada ao pagamento da indenização compensatória correspondente aos salários do período de 21.09.2011 a 20.09.2012, com depósito do FGTS e recolhimento das parcelas previdenciárias incidentes. No tópico atinente à rescisão indireta, sustenta que não há falar em óbice à declaração de rescisão indireta devido ao reconhecimento da garantia provisória de emprego e consequente condenação ao pagamento dos salários e seus reflexos. Transcreve jurisprudência. Assevera que o simples fato da empresa não ter depositado o FGTS desde novembro de 2007 configura falta patronal a ensejar a culpa do empregador e a rescisão indireta do contrato, sendo que, além disso, deve ser considerada a falta de pagamento de salários e a não formalização da rescisão, com baixa na CTPS. Postula, assim, seja reconhecida a garantia provisória de emprego, com registro de saída na CTPS na data de 21.10.2012 (considerada a projeção do período da  mencionada garantia de emprego e do aviso prévio), bem como seja reconhecido que a rescisão do contrato ocorreu na modalidade de despedida indireta/imotivada, com pagamento das parcelas que elenca.
Examino.
O documento das fls. 23-4 comprova que a contar de 03.03.2008 foi concedido à autora "auxílio doença por acidente do trabalho", benefício esse que perdurou até 20.09.2011 (fl. 27). Tratando-se de benefício previdenciário vinculado a acidente do trabalho, tenho que a reclamante, quando do ajuizamento da presente demanda, em 04.11.2011, encontrava-se ao abrigo da garantia de emprego provisória acidentária, conforme artigo 118 da Lei 8.213/91. Tais fatos já foram, inclusive, reconhecidos na sentença.
A reclamada, em contestação, negou ter ciência de que o benefício previdenciário havia cessado. De outra parte, conforme petição da fl. 141, a reclamada ajuizou pedido de recuperação judicial, com deferimento de seu processamento no dia 06.07.2011 - mais de dois meses antes da alta do benefício usufruído pela autora. Diante de tais fatos, se estabelece presunção favorável à tese da autora, de que efetivamente houve negativa de reinserção da reclamante ao trabalho quando da alta do benefício previdenciário diante da situação econômica pela qual passava a empresa. O fato de a empresa estar inoperante, em situação de recuperação judicial ou em condição pré-falimentar pode impossibilitar o retorno do empregado ao seu posto de trabalho, mas não afasta a garanti de emprego da qual a autora era detentora nem libera a empregadora de cumprir com suas obrigações contratuais perante a demandante. A não regularização da situação da reclamante, que ficou sem trabalhar, sem receber salários e com o contrato de trabalho em aberto, configura falta grave capaz de ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Além disso, a ausência de depósitos de FGTS desde novembro de 2007 (extrato das fls. 28-30) demonstra a conduta irregular da empregadora, que deixou de cumprir com obrigações essenciais do contrato de trabalho.  Ressalto, aliás, que assim vem o TST se manifestando no julgamento dos recursos acerca da matéria, v.g.:
RECURSO DE REVISTA. RESCISÃO INDIRETA. IRREGULARIDADE NO RECOLHIMENTO DO FGTS. O descumprimento das obrigações contratuais relativas aos depósitos fundiários constitui fundamento suficientemente válido para a aplicação do art. 483, "d", da CLT. A jurisprudência deste Tribunal Superior inclina-se no sentido da mitigação do princípio da imediatidade pelo trabalhador para manifestar o seu inconformismo com a conduta faltosa patronal, especialmente quando o descumprimento das obrigações se renova mês a mês. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. ( RR - 822-66.2011.5.03.0075 , Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 05/12/2012, 8ª Turma, Data de Publicação: 07/12/2012)
Concluo, portanto, que a reclamada cometeu falta grave ensejadora da rescisão indireta do contrato de trabalho, com enquadramento na alínea "d" do artigo 483 da CLT.
O ajuizamento da presente demanda, postulando a rescisão indireta do contrato de trabalho, não implica renúncia à garantia provisória de emprego da qual a reclamante era detentora. A conduta da autora, ao ajuizar esta ação, denota tão somente a busca pelo cumprimento de seus direitos. Não há incompatibilidade entre o reconhecimento da pretendida garantia de emprego e o pedido de declaração da rescisão indireta do contrato de trabalho decorrente de falta grave cometida pela empregadora, cujos efeitos são análogos à da despedida imotivada. São, portanto, devidos os salários do período da garantia de emprego reconhecida.
Nesse sentido já decidiu a 1ª Turma deste Tribunal, cuja ementa transcrevo:
ESTABILIDADE PROVISÓRIA. RESCISÃO INDIRETA. O empregado que sofre acidente do trabalho tem garantida a manutenção do seu contrato de trabalho pelo prazo de 12 meses após a cessação do auxílio-doença acidentário. Art. 118 da Lei 8.213/91. Não há incompatibilidade entre a declaração da rescisão indireta em decorrência de falta grave do empregador e o deferimento dos salários do período estabilitário. O vínculo de emprego não é mantido em virtude da falta grave por parte da empresa, não podendo o trabalhador sofrer qualquer tipo de prejuízo em decorrência deste fato. Recurso provido no particular.   (TRT da 4ª Região, 1a. Turma, 0181100-20.2009.5.04.0232 RO, em 21/03/2012, Juiz Convocado André Reverbel Fernandes - Relator. Participaram do julgamento: Desembargadora Ana Luiza Heineck Kruse, Desembargador José Felipe Ledur)
Logo, considerando que o contrato de trabalho foi rescindido por justa causa em razão de falta grave cometida pelo empregador, é devido o pagamento das parcelas decorrentes, inclusive as concernentes ao período da garantia provisória de emprego acidentária e do aviso prévio no cômputo do tempo de serviço.
O FGTS deverá ser liberado mediante expedição de alvará.
Considerando que a reclamada encontra-se em recuperação judicial, deverá ser expedido, imediatamente após o trânsito em julgado desta decisão, alvará judicial para movimentação do seguro-desemprego. Em sendo negado o benefício à autora pela autoridade competente, em decorrência de culpa imputável à reclamada, a esta incumbirá o pagamento de indenização em valor equivalente ao benefício que a autora deixou de receber, conforme se apurar em liquidação. 
Dou provimento ao recurso para: (a) decretar a rescisão indireta do contrato de trabalho por culpa do empregador; (b) declarar o direito da reclamante à garantia provisória de emprego acidentária; (c) determinar:   anotação na CTPS da autora da data de saída em 21.10.2012;  expedição de alvará para liberação do FGTS;   expedição de alvará judicial para encaminhamento do benefício do seguro-desemprego após o trânsito em julgado da decisão, e, se negado o benefício pela autoridade competente por culpa imputável ao empregador, fixar indenização a ser paga pela reclamada em valor equivalente ao benefício que deixou de ser recebido; (d) acrescer à condenação o pagamento de: indenização correspondente aos salários do período da garantia provisória de emprego  acidentária, desde a alta do benefício em 21-09-2011 até 21.09.2012;  aviso prévio de trinta dias; diferenças de férias com adicional de 1/3, gratificações natalinas, adicional de insalubridade e FGTS relativos ao período de 21-09-2011 a 21-10-2012 (pelo cômputo do período relativo à garantia provisória de emprego e do aviso prévio); acréscimo de 40% sobre o FGTS de todo o lapso contratual.

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