PROCESSO: 0000933-39.2011.5.04.0102 RO
EMENTA
GARANTIA PROVISÓRIA DE EMPREGO. RESCISÃO INDIRETA. O ajuizamento de ação onde buscada a rescisão
indireta do contrato de trabalho não implica renúncia à garantia provisória de emprego da qual o empregado é
detentor. Existência de compatibilidade entre ambos os direitos.
ACÓRDÃO
preliminarmente, por unanimidade, NÃO CONHECER DO
RECURSO QUANTO À PRETENSÃO DE PAGAMENTO DAS MULTAS DOS ARTIGOS 467 E 477 DA CLT
por ausência de fundamentação válida. No mérito, por unanimidade, DAR
PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA RECLAMANTE para: (a) decretar a
rescisão indireta do contrato de trabalho por culpa do empregador; (b) declarar
o seu direito à garantia provisória de emprego; (c) determinar: anotação na CTPS da autora da data de saída
em 21.10.2012; expedição de alvará para
liberação do FGTS; expedição de alvará
judicial para encaminhamento do benefício do seguro-desemprego após o trânsito
em julgado da decisão, e, se negado o benefício pela autoridade competente por
culpa imputável ao empregador, fixar indenização a ser paga pela reclamada em
valor equivalente ao benefício que deixou de ser recebido; (d) acrescer
à condenação o pagamento de: indenização correspondente aos salários do período
da garantia provisória de emprego
acidentária, desde a alta do benefício em 21-09-2011 até
21.09.2012; aviso prévio de trinta dias;
diferenças de férias com adicional de 1/3, gratificações natalinas, adicional
de insalubridade e FGTS relativos ao período de 21-09-2011 a 21-10-2012 (pelo
cômputo do período relativo à garantia provisória de emprego e do aviso
prévio); acréscimo de 40% sobre o FGTS de todo o lapso contratual. Valor
da condenação majorado
em R$15.000,00, e custas em R$300,00, para os efeitos legais.
RELATÓRIO
Inconformada com a decisão de primeiro grau (fls.
129-34, integrada pela sentença de embargos de declaração das fls. 146-7), que
julga procedente em parte a ação, a reclamante recorre. Pelas razões das fls.
150-3, busca a reforma da sentença quanto à garantia provisória de emprego
acidentária, término do contrato e rescisão indireta.
Sem apresentação de contrarrazões, sobem os autos a
este Tribunal para julgamento e são distribuídos a esta Relatora na forma
regimental.
VOTO RELATOR
DESEMBARGADORA CARMEN GONZALEZ:
PRELIMINARMENTE
Multas dos artigos 467 e 477 da CLT - Não
conhecimento - Ausência de ataque à sentença
As multas previstas nos artigos 467 e 477 da CLT
foram indeferidas na origem sob o fundamento de que "as rescisórias
restaram controvertidas e a declaração de rescisão se dá apenas nesta sentença".
Em suas razões recursais a reclamante limita-se a
reiterar o pedido de incidência de tais multas, sem apresentar ataque aos
fundamentos da sentença para indeferimento de tais verbas. Sinalo que o
indeferimento das multas em epígrafe não decorreu do não reconhecimento da
rescisão indireta, nem do entendimento de que houve renúncia à garantia
provisória de emprego.
O recurso não está fundamentado, atraindo a
incidência, por analogia, da jurisprudência sedimentada na Súmula 422 do TST, in
verbis:
RECURSO. APELO QUE NÃO ATACA OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO RECORRIDA.
NÃO-CONHECIMENTO. ART. 514, II, DO CPC. Não se conhece de recurso para o TST,
pela ausência do requisito de admissibilidade inscrito no art. 514, II, do CPC,
quando as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão
recorrida, nos termos em que fora proposta.
Assim, preliminarmente, não conheço do recurso, no
tópico, por ausência de fundamentação válida, conforme orienta a Súmula 422 do
TST.
MÉRITO
Garantia Provisória de Emprego - Término do Contrato
- Rescisão Indireta
Na petição inicial afirma a autora que trabalhava em
condições insalubres e não recebeu o respectivo adicional e que, além disso,
outros direitos não foram observados. Alega que não foram efetuados depósitos
de FGTS desde novembro de 2007 e que, apesar de continuar com sua CTPS
assinada, não recebe qualquer remuneração desde setembro de 2011. Aduz ter
recebido auxílio doença acidentário a partir de 03.03.2008, o qual foi
cancelado em 20.09.2011. Afirma que, ao ter seu benefício previdenciário
cancelado pelo INSS, apresentou-se à empresa para retornar ao trabalho, contudo
não foi reintegrada aos quadros da empresa, bem como não recebeu os salários,
apesar de ser detentora de garantia provisória de emprego. Sustenta que, desse
modo, diante da conduta ilegal e negligente da ré, viu-se obrigada a ajuizar a
presente demanda, onde pretende a rescisão indireta do seu contrato de
trabalho, com fulcro no artigo 483, "d", da CLT. Assevera que sua
saída da empresa se opera somente em razão do descumprimento de obrigações
fundamentais do contrato de trabalho, o que impossibilita a almejada
continuação da relação de trabalho. Afirma que em razão de sua garantia de
emprego acidentária, o vínculo deveria ser mantido até 21.09.2012. Refere que a
empresa ré enfrenta um processo de recuperação judicial e sob tal alegação não
a reintegrou às suas funções, sendo cabível o pagamento de indenização
correspondente aos salários do período estabilitário. Postula a baixa do
contrato de trabalho em sua CTPS, com data de 21.10.2012, considerando o
cômputo do período da garantia de emprego e do aviso prévio. Pretende, ainda, o
pagamento de aviso prévio, férias e gratificações natalinas do período,
depósitos do FGTS e acréscimo de 40%, liberação das guias do seguro desemprego
ou pagamento de indenização correspondente, multa dos artigos 467 e 477 da CLT.
No aditamento da fl. 72, postula o reconhecimento de que era detentora de
garantia provisória de emprego, com pagamento de indenização compensatória
equivalente a 12 meses de remuneração.
A reclamada contesta aduzindo que a autora foi
admitida em 30.03.2005 e trabalhou até ser afastada em razão de doença (não
profissional), com requerimento datado de 03.03.2008, sendo que nunca mais se
reapresentou na empresa para retomar suas atividade. Alega que até o
ajuizamento da demanda não tinha conhecimento de que a reclamante tivesse
recebido alta previdenciária. Refere que o benefício para o qual a autora foi
encaminhada foi auxílio doença e não auxílio acidente. Assevera que a autora
não foi acometida por doença profissional, não havendo falar em garantia de
emprego. Nega que a reclamante tenha se apresentado à empresa após o final da
fruição do benefício previdenciário, asseverando que não haver motivo a ensejar
a rescisão indireta do contrato de trabalho. Sustenta não ter havido qualquer
descumprimento das obrigações contratuais para com a reclamante, devendo ser
julgados improcedentes os pedidos.
A julgadora de origem considera que a reclamante
gozou benefício previdenciário da espécie acidentária e, portanto, faz jus à
garantia provisória de emprego, a ser contada a partir de 21/9/11, inclusive, e
prevista para valer até o futuro 20/9/12. Refere que, todavia, a autora optou
por ingressar com a presente demanda em 04/11/11, aproximadamente um mês após o
início do período de garantia, postulando o reconhecimento de rescisão indireta
por justa causa cometida pela empregadora que seria consistente no ato de esta
não lhe aceitar novamente no trabalho. Entende que não aceitar a reclamante no
trabalho não é motivo para rescisão indireta, referindo que, de qualquer sorte,
a reclamada, ao defender-se, negando a despedida, deixa claro que considerava o
contrato de trabalho ainda em aberto. Destaca que poderia a reclamante ter
postulado fosse reconhecida uma despedida imotivada e, ainda assim, em respeito
à garantia, deveria ter pedido, sim, a nulidade da despedida para efeito de
tempestiva reintegração, com a devida indenização do tempo de garantia ultrapassado
antes da efetiva reintegração. Considera que a garantia provisória é direito
renunciável e julga improcedente o pedido de rescisão indireta por não
encontrar suporte fático. Entende que houve simples pedido de demissão da
reclamante, na data de ajuizamento da presente, 04/11/11. Julga devidos os
salários de 21/9/11 a 04/11/11, com renúncia ao restante do período de garantia
provisória por benefício previdenciário e sem direito a aviso-prévio e
respectiva projeção. Afirma que são devidas verbas rescisórias típicas da
modalidade de extinção contratual por livre iniciativa do empregado (fl.
146-verso). Determina que a reclamada registre na CTPS da reclamante a data de
término do contrato e defere o pagamento dos salários do período da garantia
provisória de emprego, até o advento do término do contrato, em 04/11/11; férias referentes ao período aquisitivo de
2007/2008, acrescidas do terço constitucional, de forma simples; 1/12 (um doze
avos) de décimo terceiro salário proporcional do ano de 2011.
Inconformada, a reclamante recorre. Reitera as
alegações da inicial, aduzindo que o ajuizamento da presente ação foi o único
meio pelo qual pode buscar a efetivação
dos direitos que lhe são assegurados pelo ordenamento jurídico. Afirma que a
empresa recorrida entrou com pedido de recuperação judicial no dia 16.06.2011,
tendo encerrado suas atividades antes mesmo do cancelamento de seu benefício
previdenciário. Aduz que era detentora de garantia provisória de emprego
acidentária, não se conformando com a interpretação dada ao seu pedido de
rescisão indireta, haja vista o descumprimento pelo empregador de obrigações do
contrato de trabalho, como o pagamento de salários e os depósitos do FGTS.
Alega ter postulado a conversão da aludida garantia de emprego em indenização
compensatória, pois era impossível sua recolocação na empresa diante do
encerramento das atividades dessa. Assevera que em momento algum renunciou à
garantia de emprego a que tem direito. Afirma que apenas permaneceu em
funcionamento na empresa o setor administrativo e que a culpa do empregador
configurou-se no momento em que deixou de readmiti-la, furtando-se do pagamento
dos salários, recolhimentos previdenciários e depósitos de FGTS e deixando de
formalizar a rescisão, com quitação das verbas decorrentes e baixa na CTPS.
Pretende a reforma da sentença para que, reconhecida a garantia provisória de
emprego, seja a reclamada condenada ao pagamento da indenização compensatória
correspondente aos salários do período de 21.09.2011 a 20.09.2012, com depósito
do FGTS e recolhimento das parcelas previdenciárias incidentes. No tópico
atinente à rescisão indireta, sustenta que não há falar em óbice à declaração
de rescisão indireta devido ao reconhecimento da garantia provisória de emprego
e consequente condenação ao pagamento dos salários e seus reflexos. Transcreve
jurisprudência. Assevera que o simples fato da empresa não ter depositado o
FGTS desde novembro de 2007 configura falta patronal a ensejar a culpa do
empregador e a rescisão indireta do contrato, sendo que, além disso, deve ser
considerada a falta de pagamento de salários e a não formalização da rescisão,
com baixa na CTPS. Postula, assim, seja reconhecida a garantia provisória de
emprego, com registro de saída na CTPS na data de 21.10.2012 (considerada a
projeção do período da mencionada
garantia de emprego e do aviso prévio), bem como seja reconhecido que a
rescisão do contrato ocorreu na modalidade de despedida indireta/imotivada, com
pagamento das parcelas que elenca.
Examino.
O documento das fls. 23-4 comprova que a contar de
03.03.2008 foi concedido à autora "auxílio doença por acidente do
trabalho", benefício esse que perdurou até 20.09.2011 (fl. 27).
Tratando-se de benefício previdenciário vinculado a acidente do trabalho, tenho
que a reclamante, quando do ajuizamento da presente demanda, em 04.11.2011,
encontrava-se ao abrigo da garantia de emprego provisória acidentária, conforme
artigo 118 da Lei 8.213/91. Tais fatos já foram, inclusive, reconhecidos na
sentença.
A reclamada, em contestação, negou ter ciência de que
o benefício previdenciário havia cessado. De outra parte, conforme petição da
fl. 141, a reclamada ajuizou pedido de recuperação judicial, com deferimento de
seu processamento no dia 06.07.2011 - mais de dois meses antes da alta do benefício
usufruído pela autora. Diante de tais fatos, se estabelece presunção favorável
à tese da autora, de que efetivamente houve negativa de reinserção da
reclamante ao trabalho quando da alta do benefício previdenciário diante da
situação econômica pela qual passava a empresa. O fato de a empresa estar
inoperante, em situação de recuperação judicial ou em condição pré-falimentar
pode impossibilitar o retorno do empregado ao seu posto de trabalho, mas não
afasta a garanti de emprego da qual a autora era detentora nem libera a
empregadora de cumprir com suas obrigações contratuais perante a demandante. A
não regularização da situação da reclamante, que ficou sem trabalhar, sem
receber salários e com o contrato de trabalho em aberto, configura falta grave
capaz de ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Além disso, a
ausência de depósitos de FGTS desde novembro de 2007 (extrato das fls. 28-30)
demonstra a conduta irregular da empregadora, que deixou de cumprir com
obrigações essenciais do contrato de trabalho.
Ressalto, aliás, que assim vem o TST se manifestando no julgamento dos
recursos acerca da matéria, v.g.:
RECURSO DE REVISTA. RESCISÃO INDIRETA. IRREGULARIDADE NO
RECOLHIMENTO DO FGTS. O descumprimento das obrigações contratuais relativas aos
depósitos fundiários constitui fundamento suficientemente válido para a
aplicação do art. 483, "d", da CLT. A jurisprudência deste Tribunal
Superior inclina-se no sentido da mitigação do princípio da imediatidade pelo
trabalhador para manifestar o seu inconformismo com a conduta faltosa patronal,
especialmente quando o descumprimento das obrigações se renova mês a mês.
Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. ( RR -
822-66.2011.5.03.0075 , Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento:
05/12/2012, 8ª Turma, Data de Publicação: 07/12/2012)
Concluo, portanto, que a reclamada cometeu falta
grave ensejadora da rescisão indireta do contrato de trabalho, com
enquadramento na alínea "d" do artigo 483 da CLT.
O ajuizamento da presente demanda, postulando a
rescisão indireta do contrato de trabalho, não implica renúncia à garantia
provisória de emprego da qual a reclamante era detentora. A conduta da autora,
ao ajuizar esta ação, denota tão somente a busca pelo cumprimento de seus
direitos. Não há incompatibilidade entre o reconhecimento da pretendida
garantia de emprego e o pedido de declaração da rescisão indireta do contrato
de trabalho decorrente de falta grave cometida pela empregadora, cujos efeitos
são análogos à da despedida imotivada. São, portanto, devidos os salários do
período da garantia de emprego reconhecida.
Nesse sentido já decidiu a 1ª Turma deste Tribunal,
cuja ementa transcrevo:
ESTABILIDADE PROVISÓRIA. RESCISÃO INDIRETA. O empregado que sofre
acidente do trabalho tem garantida a manutenção do seu contrato de trabalho
pelo prazo de 12 meses após a cessação do auxílio-doença acidentário. Art. 118
da Lei 8.213/91. Não há incompatibilidade entre a declaração da rescisão
indireta em decorrência de falta grave do empregador e o deferimento dos
salários do período estabilitário. O vínculo de emprego não é mantido em
virtude da falta grave por parte da empresa, não podendo o trabalhador sofrer
qualquer tipo de prejuízo em decorrência deste fato. Recurso provido no
particular. (TRT da 4ª Região, 1a.
Turma, 0181100-20.2009.5.04.0232 RO, em 21/03/2012, Juiz Convocado André
Reverbel Fernandes - Relator. Participaram do julgamento: Desembargadora Ana
Luiza Heineck Kruse, Desembargador José Felipe Ledur)
Logo, considerando que o contrato de trabalho foi
rescindido por justa causa em razão de falta grave cometida pelo empregador, é
devido o pagamento das parcelas decorrentes, inclusive as concernentes ao
período da garantia provisória de emprego acidentária e do aviso prévio no
cômputo do tempo de serviço.
O FGTS deverá ser liberado mediante expedição de
alvará.
Considerando que a reclamada encontra-se em
recuperação judicial, deverá ser expedido, imediatamente após o trânsito em
julgado desta decisão, alvará judicial para movimentação do seguro-desemprego.
Em sendo negado o benefício à autora pela autoridade competente, em decorrência
de culpa imputável à reclamada, a esta incumbirá o pagamento de indenização em
valor equivalente ao benefício que a autora deixou de receber, conforme se
apurar em liquidação.
Dou provimento ao recurso para: (a) decretar a
rescisão indireta do contrato de trabalho por culpa do empregador; (b) declarar
o direito da reclamante à garantia provisória de emprego acidentária; (c) determinar: anotação na CTPS da autora da data de saída
em 21.10.2012; expedição de alvará para
liberação do FGTS; expedição de alvará
judicial para encaminhamento do benefício do seguro-desemprego após o trânsito
em julgado da decisão, e, se negado o benefício pela autoridade competente por
culpa imputável ao empregador, fixar indenização a ser paga pela reclamada em
valor equivalente ao benefício que deixou de ser recebido; (d) acrescer
à condenação o pagamento de: indenização correspondente aos salários do período
da garantia provisória de emprego
acidentária, desde a alta do benefício em 21-09-2011 até
21.09.2012; aviso prévio de trinta dias;
diferenças de férias com adicional de 1/3, gratificações natalinas, adicional
de insalubridade e FGTS relativos ao período de 21-09-2011 a 21-10-2012 (pelo
cômputo do período relativo à garantia provisória de emprego e do aviso
prévio); acréscimo de 40% sobre o FGTS de todo o lapso contratual.
Nenhum comentário:
Postar um comentário