sexta-feira, 19 de julho de 2013

EMENTA HORAS EXTRAS. EMPRESA COM MENOS DE DEZ EMPREGADOS. ÔNUS DA PROVA DA JORNADA DE TRABALHO. Embora as empresas com menos de dez empregados não possuam obrigação legal de manter registro de horário dos seus empregados, o pagamento de horas extras faz presumir o controle patronal das horas trabalhadas, invertendo o encargo probatório que passa a ser da reclamada.

Acórdão do processo 0000595-23.2012.5.04.0234 (RO)
Redator: MARCOS FAGUNDES SALOMÃO
Participam: RICARDO CARVALHO FRAGA, LUIZ ALBERTO DE VARGAS
Data: 12/06/2013   Origem: 4ª Vara do Trabalho de Gravataí
Andamentos do processo

PROCESSO: 0000595-23.2012.5.04.0234 RO
  
EMENTA
HORAS EXTRAS. EMPRESA COM MENOS DE DEZ EMPREGADOS. ÔNUS DA PROVA DA JORNADA DE TRABALHO. Embora as empresas com menos de dez empregados não possuam obrigação legal de manter registro de horário dos seus empregados, o pagamento de horas extras faz presumir o controle patronal das horas trabalhadas, invertendo o encargo probatório que passa a ser da reclamada.  
ACÓRDÃO
por unanimidade de votos, dar parcial provimento ao recurso do reclamante para acolher a contradita da testemunha Tatiane Pereira dos Santos, valorando o depoimento prestado a título de informação, bem como para acrescer à condenação o pagamento de diferenças salariais oriundas de plus salarial de 20% sobre o salário contratual, com reflexos em repousos remunerados, aviso prévio, horas extras, natalinas, férias com o terço constitucional e FGTS com o acréscimo legal de 40%; adicional de insalubridade em grau máximo, a ser calculado com base no salário-mínimo, com reflexos em 13º salário, férias com 1/3, aviso-prévio e FGTS com acréscimo de 40%; horas extras excedentes das 07h20min diárias e/ou 44h semanais, de acordo com a jornada arbitrada, com adicional de 50% e reflexos em repousos semanais remunerados, férias com 1/3, 13º salário e FGTS com 40%, mantida a condenação relativa ao domingo trabalhado no mês de dezembro e autorizado o abatimento dos valores pagos sob a mesma rubrica; uma hora extra a título de intervalo intrajornada suprimido, de acordo com a jornada arbitrada, com adicional de 50% e reflexos em repousos semanais remunerados, férias com 1/3, 13º salário e FGTS com 40% e honorários assistenciais à razão de 15% sobre o valor bruto da condenação. Valor da condenação que se acresce em R$ 2.000,00. Custas majoradas em R$ 40,00. 
RELATÓRIO
O reclamante recorre da sentença de parcial procedência da ação.
Busca a reconsideração do julgado no tocante à contradita da testemunha convidada pela reclamada, diferenças salariais por acúmulo de funções, horas extras, adicional de insalubridade, indenização por danos morais e honorários advocatícios.
A reclamada não apresentou contrarrazões.   
VOTO RELATOR
JUIZ CONVOCADO MARCOS FAGUNDES SALOMÃO:  
1. CONTRADITA DA TESTEMUNHA CONVIDADA PELA RECLAMADA
O reclamante requer seja reconhecida a contradita da testemunha convidada pela reclamada, sob a alegação de exercício de cargo de confiança com poderes de gestão. Afirma que, sendo a autora das ofensas narradas na petição inicial, a testemunha não tem isenção de ânimo para depor. Cita os arts. 405 do CPC e 829 da CLT.
O art. 405 do CPC contém rol das pessoas impedidas ou suspeitas para depor como testemunhas. No caso, a testemunha convidada pelo reclamado, Tatiane Pereira dos Santos, era Gerente do estabelecimento reclamado e superior hierárquica do reclamante. Não bastasse, a testemunha foi apontada como a suposta autora dos fatos que ensejariam a indenização por danos morais pretendida. Considerando que a prova envolve fatos de cunho pessoal com envolvimento direto da testemunha, é evidente que essa não possui isenção de ânimo para depor.
Não bastasse, a reclamada é empresa de pequeno porte, com menos de 10 empregados, o que fortalece a fidúcia da Gerente em relação aos demais empregados.
Dou provimento ao recurso para acolher a contradita da testemunha, Tatiane Pereira dos Santos, valorando o depoimento prestado a título de informação, apenas.
2. DIFERENÇAS SALARIAIS POR ACÚMULO DE FUNÇÕES
O autor não se conforma com o indeferimento das diferenças salarias por acúmulo das funções de limpeza e panfletagem. Alega que tais tarefas não fazem parte das atribuições do cargo de Auxiliar de Vendas. Cita o art. 468 da CLT. Busca o pagamento de plus salarial.
O autor laborou para a reclamada de 23 de novembro de 2011 a 05 de março de 2012, na função de Auxiliar de Vendas.
Configura-se o acúmulo de funções quando o empregador, no curso do contrato de trabalho, passa a atribuir ao empregado à execução de atividade mais complexa ou especializada e estranha ao conteúdo da função contratada. Tratando-se de atividades correspondentes entre si, a ampliação de atribuições, por si só, não enseja o pagamento de plus salarial. De acordo com o parágrafo único do art. 456 da CLT: A falta de prova ou inexistindo cláusula expressa a tal respeito, entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal. No caso de cumprimento de atividades diversas das contratadas, se não extrapolada a complexidade das atividades normais, não há suporte fático ou legal para caracterizar o acúmulo capaz de ensejar acréscimo salarial.
A contestação impugna a alegação de que tenha, o autor, laborado na limpeza de banheiros, reconhecendo, entretanto, que os "colaboradores" auxiliavam na limpeza superficial da loja, que consistia em tirar o pó dos balcões, uma vez por semana, já que a limpeza pesada ficava ao encargo de uma pessoa terceirizada.
A contrariar a versão empresarial estampada na contestação, o depoimento do próprio preposto. Segundo ele, o autor era auxiliar de vendas; que a limpeza geral da loja era feita por uma faxineira que vinha a cada 15 dias; que os banheiros, em número de 2, eram limpos pelos empregados; que a loja possui 5 ou 6 empregados (fl. 93).
A corroborar a tese do autor de que, de fato, a limpeza do banheiro fazia parte das obrigações do contrato de trabalho entabulado com a reclamada,  o depoimento da informante convidada a depor pela reclamada, Tatiane dos Santos, que para a reclamada trabalha "com poderes de gerente". Conforme seu relato,a manutenção diária do banheiro é feita pelos empregados, havendo uma faxineira a cada 15 dias para a limpeza mais pesada; que isso implica a limpeza de uma a duas vezes por semana para cada empregado; que são 7 o número de empregados (fl. 94).
A despeito de o autor admitir, em depoimento pessoal, ter sido avisado, desde a sua admissão, de que teria a obrigação de limpar o balcão do estabelecimento e de organizar a vitrine, nada justifica o acréscimo funcional relativo à limpeza de banheiros.
É inegável que a assear banheiro de uso coletivo - ainda que para pequeno grupo de usuários, colegas de trabalho -, refoge sobremaneira àquelas tarefas inerentes a vendas, para as quais foi originalmente contratado o trabalhador.
Não é outra a conclusão acerca do motivo fundante para que o empregador desloque empregados vendedores na tarefa de limpeza de banheiros, senão o de economizar, ter menos despesas com prestadores de serviços de limpeza. De notar-se a esse propósito que Tatiane dos Santos, informante, revela que existia uma faxineira que comparecia a cada 15 dias para a limpeza mais pesada. Não há dúvidas acerca da precariedade desse serviço, mormente em razão do expressivo lapso temporal entre uma faxina e outra, restando evidenciada, daí, a necessidade da intervenção de trabalhadores vendedores, em sistema de rodízio, na limpeza de banheiros.
Quanto à atividade de panfletagem tal se inclui no conjunto de atribuições do Auxiliar de Vendas, na esteira do parágrafo único do art. 456 da CLT.
Face à absoluta incompatibilidade das tarefas de limpeza de banheiro com as funções de Auxiliar de Vendas, provejo o recurso para, fixando plus salarial de 20% sobre o salário contratual, deferir diferenças salariais ao autor, com reflexos em repousos remunerados, aviso prévio, horas extras, natalinas, férias com o terço constitucional e FGTS com o acréscimo legal de 40%.
3. HORAS EXTRAS
O reclamante defende a confissão do preposto da reclamada com relação ao tópico. Cita o art. 843, § 1º da CLT.
A Julgadora entendeu que cabia ao reclamante a comprovação da jornada extraordinária e da supressão dos intervalos, o que não foi demonstrado, mas condenou a reclamada ao pagamento de um domingo no mês de dezembro de 2011.
Via de regra, a ré estaria dispensada de manutenção dos controles de horário por contar com menos de 10 empregados, pertencendo ao reclamante o ônus da prova quanto à jornada declinada na petição inicial. Entretanto, os contracheques contemplam o pagamento de horas extras (fl. 55, p. ex.), o que faz presumir ocontrole patronal das horas trabalhadas. Essa circunstância aliada ao desconhecimento do preposto sobre a jornada - inadmissível ante ao referido controlerealizado - faz inverter o encargo probatório, alicerçando a presunção de veracidade da jornada declinada na inicial.
Nesse aspecto, o autor informou que realizava jornada extraordinária de duas horas diárias sem o correto  pagamento. Pugnou pelo acolhimento de carga superior caso verificada na instrução processual. Em depoimento, declarou laborar das 10h às 19h ou 20h e, posteriormente, das 09h às 18h30min. Afirmou que o intervalo dependia do movimento da loja (fl. 93).
Não há outros elementos de prova que limitem a versão do reclamante, uma vez que foi atribuída a condição de informante à única testemunha ouvida a convite da reclamada.
Arbitro a jornada do autor como sendo até o dia 15 de dezembro de 2011, de segunda a sábado, das 10h às 19h, com uma hora de intervalo e até às 20h nos demais, com 30 minutos de intervalo e, a partir de 16 de dezembro, das 09h às 18h30min, com 30 minutos de intervalo em três dias da semana e uma hora nos demais.
O art. 71 da CLT estabelece que empregador deve conceder o intervalo mínimo de uma hora nas jornadas excedentes de seis horas. O seu § 4º dispõe que, se o intervalo for suprimido, o período correspondente deverá ser remunerado com um acréscimo de, no mínimo, cinquenta por cento.
Revendo posicionamento anterior no sentido de que seria devido somente o tempo suprimido do intervalo, passo a adotar a Súmula nº 437, item I, do TST. Comprovado o trabalho no período destinado ao intervalo conforme a jornada arbitrada, faz jus o empregado ao pagamento da hora integral, com o acréscimo legal.
A reclamada deverá pagar as horas extras excedentes das 07h20min diárias e/ou 44h semanais, com adicional de 50% e reflexos em repousos semanais remunerados, férias com 1/3, 13º salário e FGTS com 40%, bem como uma hora extra correspondente ao intervalo intrajornada suprimido, conforme a jornada arbitrada, mantida a condenação relativa ao domingo trabalhado no mês de dezembro. Autorizado o abatimento dos valores pagos sob a mesma rubrica.
Dou provimento.
4. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE
O reclamante não se conforma com o indeferimento do adicional de insalubridade. Argumenta ter restado comprovado o contato com agentes biológicos na realização da limpeza do banheiro e retirada do lixo sem utilização de EPIs. Refere a análise qualitativa. Colaciona jurisprudência. Pretende o pagamento do adicional em grau máximo a ser calculado sobre o salário contratual.
O perito concluiu pela ausência de insalubridade nas atividades desempenhadas pelo reclamante.
De acordo com a narrativa do autor confirmada pelo preposto, a atividade de limpeza dos banheiros e recolhimento do lixo, que ocasionaria o contato com produtos químicos e agentes biológicos, era realizada diariamente pelos empregados em sistema de rodízio.
A reclamada possui dois banheiros para uso dos empregados e do público em geral. Considerando o número de empregados inferior a dez, a atividade de limpeza dos banheiros e recolhimento dos lixos não pode ser considerada eventual ocorrendo de forma rotineira.
Acerca de tal atividade, conforme se tem reiteradamente decidido em casos semelhantes, é devido o adicional de insalubridade no grau máximo, a teor do Anexo 14 da NR -15. Na realização dessas atividades podem estar presentes agentes patogênicos causadores de uma série de doenças, mormente quando não há utilização de EPIs.
A situação verificada no caso não é a mesma contemplada na OJ nº 04, II, da SDI-I do TST, que trata de limpeza de escritórios e residências, ou a simples coleta de lixo nessas dependências.
Ressalto desnecessário verificar o tempo de contato com o agente insalubre, tendo em vista que o enquadramento, no caso, é caracterizado pela avaliação qualitativa.
O autor faz jus, portanto, ao pagamento de adicional de insalubridade em grau máximo.
Em relação à base de cálculo do adicional de insalubridade, recorro à analogia ao art. 193 da CLT para determinar que o adicional de insalubridade, a partir de 05 de outubro de 1988, deva ser calculado sobre o salário contratual. Invoco, como razão de decidir, as normas dos arts. 7º, XXIII, e 5º, § 1º, da Constituição Federal, 4º da LINDB, 8º da CLT, além da decisão do STF, datada de 02 de outubro de 1998, que segue:
    Ante o exposto, conheço do recurso extraordinário e lhe dou provimento para afastar, a partir da promulgação da Carta de 1988, a vinculação ao salário mínimo (piso nacional de salário) estabelecida pelas instâncias ordinárias, devendo o processo retornar ao TRT, a fim de que decida qual critério legal substitutivo do adotado é aplicável: é o meu voto (Revista de Jurisprudência Trabalhista nº 183, pg. 90).
A Turma Julgadora, entretanto, majoritariamente, posiciona-se de forma distinta. Consigna o entendimento, segundo o qual, enquanto o legislador não definir a nova base de incidência do adicional de insalubridade, o cálculo da parcela deve ser realizado sobre o salário-mínimo nacional.  
reflexos repousos
Dou provimento ao recurso do reclamante para acrescer à condenação o pagamento do adicional de insalubridade em grau máximo, a ser calculado com base no salário-mínimo, com reflexos em 13º salário, férias com 1/3, aviso-prévio e FGTS com acréscimo de 40%.
5. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS
O autor defende comprovado o dano moral. Refere o depoimento da testemunha, demonstrando que passou por humilhação na presença de todos que se encontravam na loja.
Na petição inicial, o autor narrou ter sofrido abalo moral por conta da forma como foi tratado pela gerente Tatiane. Narrou ter sido ofendido na ocasião em que efetuava uma venda de aparelho de celular para a própria ofensora e, também, no dia do pagamento da sua rescisão contratual, por não ter levado o uniforme para devolução, tendo sido ameaçado. Destacou, ainda, ter reclamado do desconto de R$ 100,00 no termo rescisório, correspondente a um empréstimo informal e pessoal obtido com um de seus colegas, o que não poderia ter sido efetuado. Esclareceu ter sido humilhado na frente de todos que estavam na loja.
Em depoimento o recorrente informou que o relacionamento com a Gerente Tatiane não era ruim. Esclareceu que uma única vez a gerente lhe ofendeu lhe chamando de "burro"; que tal ocorreu em razão de uma coisa errada que o depoente fez no sistema (fl. 93).
Embora a testemunha convidada pelo reclamante tenha presenciado a discussão entre o autor e Tatiane na ocasião da rescisão do contrato, o próprio reclamante não fez referência ao fato. Nos termos do depoimento do recorrente, não há caracterização do alegado abalo moral decorrente das humilhações e xingamentos experimentados.
Nego provimento.
6. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
O autor pretende o deferimento de honorários advocatícios. Refere a Lei nº 5.584/70. Colaciona jurisprudência.
O reclamante declara sua insuficiência econômica (fl. 14), e requer a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita (honorários assistenciais/advocatícios), instituto ampliado após o advento da Constituição Federal de 1988 que, em seu art. 133, assegura a indispensabilidade do advogado na Administração da Justiça, conforme se entende. Devido, pois, o benefício nos termos das Leis nºs 1.060/50 e 5.584/70, independentemente da apresentação de credencial sindical.
Não adoto, portanto, as orientações insertas nas Súmulas nºs 219 e 329 do TST, bem como na O.J. nº 305 da SDI-I do TST. 
Faz jus, portanto, ao pagamento de honorários assistenciais à razão de 15% sobre o valor bruto da condenação.
Dou provimento.

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